Faltou luz.
E logo os olhos começam a enxergar formas luminosas no breu, e tão logo corremos pra caçar o celular pra iluminar o caminho e ver se achamos alguma vela ou lanterna. É assim que lembramos para que as velas servem. Quando acaba a eletricidade nos damos conta de como somos dependentes, e ainda percebemos que se não fosse por ela não teríamos mais da metade dos apetrechos que temos em casa. É fácil reparar que nós somos movidos a eletricidade. Não posso assistir televisão, não tem como acessar a Internet, meu telefone não liga, o celular não tem bateria, não dá pra dormir sem ventilador, não posso ligar o ar condicionado, os semáforos não funcionam, as câmeras não vigiam, não tenho despertador... e assim vamos declarando a nossa inutilidade e falta de imaginação.
Acabou luz.
E logo os ouvidos se incomodam com o zumbido do silêncio. O fato de sermos capazes de escutar nitidamente o tic-tac do relógio, aquele relógio da cozinha que nós não lembrávamos que fazia barulho porque a TV ou o rádio sempre altos o abafava, atordoa.
Não há o som da televisão do vizinho, do ventilador, do ar condicionado, de carros passando toda hora na rua. E é assim que descobrimos que pedimos por quietude, mas a quietude nos constrange.
Teve apagão.
“Mãe por que só no ônibus tem luz?” “Porque lá a bateria não é ligada à luz daqui, oras”. E descobrimos que nosso instinto é o mesmo das moscas, mas por sorte somos maiores e mais resistentes e quando encostamos nas lâmpadas não morremos queimados.
Está escuro.